22 de julho de 2024

CUIDADO COM O CACHORRO

Dr. Ulisses tinha uma clínica de urologia no bairro, alguns homens entravam sem olhar para trás, eles temiam ser vistos, eles tinham mais medo de serem vistos entrando na clínica do Dr. Ulisses do que estarem andando de mãos dadas com a amante pelas ruas.

Dr. Ulisses era um senhor de quase 59 anos, pois tinha exatamente 58 anos, 11 meses e 29 dias quando isso aconteceu, ele estava tomando o famoso pingado (café com leite) no boteco de frente a sua clínica, quando a famosa Xexéu (a garota transexual do bairro) apareceu pedindo um café forte e um pão na chapa para o Senhor Alvarenga (um luso que desde 1950, quando chegou aqui, não perdeu o seu sotaque e ainda é chamado de vascaíno, por mais que ele retruque dizendo que torce para o Fluminense), Dr. Ulisses assustou ao ouvir a voz grossa vindo dos lábios delicados de Xexéu.

Dr. Ulisses, terminou a última consulta do dia, pegou o seu carro e foi embora para a sua casa que ficava quase do outro lado da cidade, mas em sua cabeça tinha ficado marcado a voz de Xexéu, ele sabia que ela era ele anteriormente, mas ficou impressionado que o corpo feminino não condizia muito com a voz masculina, mas ele não ficou só pensando nisso, tinha algo mais curioso na sua mente.

Ao chegar na rua Antônio Mello Matos, avistou uma garota aparentemente ter 17 anos, pele branca, corpo esbelto, cabelos longos voando conforme o vento batia neles, Dr. Ulisses sorriu momentaneamente, porém parou de rir sozinho, pois viu a placa "CUIDADO COM O CACHORRO" bem de frente ao um portão velho de ferro, ele nunca tinha reparado nesse aviso, mas continuo o seu trajeto.

Alguns minutos já em casa, ele estava tomando seu banho, a sua esposa estava refogando o feijão e os seus filhos brigavam pelo controle da televisão, tudo normal, após o banho, sentou-se na mesa para jantar com sua família. Sua esposa, Marcia, servia o jantar enquanto ele tentava acompanhar a conversa animada dos filhos sobre algum programa de televisão. No entanto, seus pensamentos continuavam a derivar, voltando repetidamente para a voz de Xexéu e a garota que vira na rua Antônio Mello Matos.

- Ulisses, você está bem? - perguntou Marcia, notando a distração do marido.

- Sim, sim. Só um dia longo no trabalho - respondeu, tentando afastar os pensamentos que o perturbavam.

Mais tarde, naquela noite, quando todos já estavam dormindo, Dr. Ulisses levantou-se da cama e foi até o escritório improvisado que tinha em casa. Sentou-se à mesa, ligou o abajur e ficou olhando para o nada. Ele era um homem de ciência, habituado a lidar com fatos concretos e diagnósticos precisos, mas os eventos daquele dia o deixaram com uma sensação estranha, quase mística.

Foi então que algo inusitado ocorreu. Ele se lembrou de uma conversa que teve com um antigo colega de faculdade, agora um renomado psicólogo. O amigo falara sobre a importância de se entender e aceitar o que não se compreende à primeira vista, sobre como certas experiências podem nos levar a explorar partes desconhecidas de nós mesmos.

Na manhã seguinte, Dr. Ulisses decidiu fazer algo que nunca tinha feito antes, após terminar suas consultas, ele dirigiu até a rua Antônio Mello Matos novamente, na esperança de encontrar a garota que vira no dia anterior, havia algo naquela visão que ele precisava desvendar.

Parou o carro e desceu, caminhando devagar pela calçada. Passou pelo portão velho de ferro com a placa de "CUIDADO COM O CACHORRO" e notou que a casa parecia abandonada, mas ainda assim, emanava uma estranha sensação de presença.

Um comentário:

  1. Belo conto. Ansioso pela continuação desse e de muitos outros.

    Boa semana!

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    Até mais, Emerson Garcia

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